Como reviver sonoridades da vida de tempos antigos? E por quê? O músico catalão Jordi Savall i Bernadet é uma das pessoas que vêm dedicando uma vida inteira para achar essas respostas. Em mais de quarenta anos de carreira, ele vem realizando um relevante trabalho de pesquisa, execução e registro fonográfico de músicas de séculos atrás. Um trabalho de “arqueologia” e recriação de sonoridades perdidas no tempo, e que deixaram apenas vestígios em papel. Savall é um virtuoso da viola da gamba e do rebab, instrumentos de cordas friccionadas. Sua pesquisa tem dezenas de parceiros, que integram, ou já integraram, os grupos fundados por ele: o Hespèrion XXI, o grupo vocal La Capella Reial de Catalunya e a orquestra Le Concert des Nations.
Entre os primeiros discos de Savall com o Hespèrion XX estão
El Barroco Español (1978) e Llibre Vermell de Montserrat (1979), que
resgatam a música antiga espanhola, além de Cansós
de Trobairitz (1978), que revisita composições de mulheres “trovadoras” da
Idade Média. Esses discos fazem parte de dez que o grupo lançou dentro coleção da
gravadora EMI, Reflexe: stationen
europäischer musik (“Reflexos: épocas da música europeia”). Editada nos
anos 70 e começo dos 80, a coleção de mais de meia centena de discos teve a presença
de nomes célebres da “música antiga”, como Hans-Martin Linde e Thomas Binkley.
Os citados títulos do Hespèrion XX já trazem a parceria fecunda com a soprano
Montserrat Figueras, falecida em 2012, que foi esposa de Savall e mãe de seus
filhos. Estes, atualmente, são também parceiros do pai. Outros nomes de
destaque durante toda a trajetória do Hespèrion XX são os alaudistas Hopkinson
Smith e Rolf Lislevand, conceituados solistas do instrumento; o percussionista
Pedro Estevan, que até hoje faz parte do grupo; e o maestro e organista Ton
Koopman, que, entre as décadas de 90 e 2000, com a Orquestra e Coro Barroco de
Amsterdan (The Amsterdam Baroque Orchestra & Choir) realizou a tarefa
prodigiosa de registrar em discos o ciclo integral das cantatas de Johann
Sebastian Bach (1685-1750).
Os discos e concertos mais recentes de Savall realizam um diálogo
cada vez mais forte entre as diferentes culturas do planeta. Entre eles, Ludi Musici: o espírito da dança 1450-1650 (coletânea
de registros feitos entre 1997 e 2006) e Jerusalém,
a cidade das duas “pazes”: a paz celeste e a paz terrestre (2008). A
sonoridade do Hespèrion XXI passa a ser ainda mais abrangente, incluindo
instrumentos como o ud árabe (ancestral
do alaúde europeu) e o santur persa
(instrumento de cordas percutidas com dois martelinhos). Em consequência de seu
trabalho, em 2008 Savall e Montserrat Figueras receberam da UNESCO o título de “Artistas pela Paz”.
Em setembro deste ano de 2014, o maestro estará visitando Recife
e Olinda. No dia 5, vai ministrar pela manhã um masterclass no Conservatório
Pernambucano de Música e, à noite, fará um concerto com Andrew Lawrence-King (harpa)
e Enrike Solinís (tiorba), pela MIMO – Mostra Internacional de Música em Olinda
(programação – clique aqui). O
masterclass tem como título O diálogo das
almas, e deve tratar justamente dessa troca entre as músicas do Oriente e
do Ocidente. Quem sabe o diálogo musical pode ajudar a salvar o nosso mundo do
preconceito e da violência entre os povos?
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Esta postagem está sendo
publicada também no blog Quadrada dos Canturis (quadradadoscanturis.blogspot.com.br/). Agradeço a atenção dos
amigos Dassanta e Violeiro do Sertão, administradores desse blog.
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Confira (clique nos títulos) algumas gravações com direção de
Jordi Savall:
1.
Giraut de Bornell: Si·us quer conselh, bel'ami' alamanda
(do disco Cansós de Trobairitz,1978;
cantam: Josep Benet e Montserrat
Figueras)
2.
Llibre Vermell de Montserrat: Stella Splendens in monte
(do disco Llibre Vermell de Montserrat, 1979)
3.
Llibre Vermell de Montserrat: Mariam Matrem Virginem
(do concerto de 2013)
4.
Monteverdi: L'Orfeo
(ópera representada em 2002)
5.
Jerusalén: a cidade das duas “pazes”
(concerto de 2010)